Aumento da ansiedade e do estresse compromete habilidades fundamentais para uma direção segura: a atenção, a tomada de decisão e o tempo de reação.
Neste 10 de outubro, Dia Mundial da Saúde Mental, um dado alarmante coloca em perspectiva a segurança nas ruas e estradas brasileiras: 52% da população já considera a saúde mental o principal problema de saúde do país. O número, de uma pesquisa recente do instituto Ipsos, representa um salto dramático em relação aos 18% registrados em 2018. Além disso, acende um alerta para um perigo muitas vezes invisível: o estado emocional de quem dirige.
A psicóloga Adalgisa Lopes, presidente da Associação das Clínicas de Trânsito de Minas Gerais (Actrans-MG), explica que a conexão é direta. O aumento da ansiedade e do estresse – apontado como preocupação por 33% dos brasileiros – compromete as habilidades fundamentais para uma direção segura: a atenção, a tomada de decisão e o tempo de reação.
“Um motorista que está lidando com preocupações não está com sua atenção 100% na via. A carga cognitiva de quem dirige enquanto gerencia um diálogo interno desgastante é tão perigosa quanto a de quem usa o celular ao volante”, alerta a especialista.
A análise é complementada por Giovanna Varoni, psicóloga especialista em trânsito e diretora da Actrans-MG.
Para ela, a crise que se manifesta no trânsito é reflexo de um problema mais profundo. “O país ainda se depara com barreiras estruturais. Ou seja, a oferta de serviços especializados é insuficiente, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) sofrem com a falta de recursos, e o acesso à rede de saúde mental é desigual. Soma-se a isso o estigma histórico que muitas vezes impede as pessoas de buscarem ajuda”, pontua Giovanna.
A deterioração da saúde mental cria um ciclo perigoso nas vias brasileiras. Condutores com transtornos mentais não tratados têm maior propensão a comportamentos agressivos no trânsito, desrespeito às normas de segurança e tomada de decisões impulsivas. Além disso, sintomas como fadiga mental, irritabilidade e dificuldade de concentração, comuns em quadros de desequilíbrio emocional, podem ser tão prejudiciais quanto dirigir sob efeito de álcool. Assim, aumentando exponencialmente as chances de acidentes e colocando em risco não apenas o condutor, mas todos os usuários das vias públicas.
Atenção holística
Giovanna destaca que compreender a crise requer reconhecer a complexidade do ser humano. “Somos seres biopsicossociais, o que significa que corpo, mente e ambiente estão profundamente interligados. A saúde mental não pode ser dissociada das condições de vida, das relações e do contexto. Cuidar da mente é também cuidar das condições sociais e emocionais que sustentam o equilíbrio”.
A diretora da Actrans explica que a solução passa por uma abordagem multifacetada. “Cuidar da saúde mental requer olhar o indivíduo de forma integral. Também é necessário ampliar o investimento em prevenção, educação emocional e formação de profissionais capacitados para atuar em diferentes contextos, inclusive no trânsito, no trabalho e nas escolas”, afirma Giovanna.
Uma prioridade social e política
As especialistas concordam que o tema precisa ultrapassar as campanhas pontuais. Para Giovanna Varoni, a discussão deve ser elevada a um novo patamar. “Promover saúde mental é promover dignidade, acolhimento e acesso equitativo ao cuidado. É entender que não existe qualidade de vida sem equilíbrio emocional e que o bem-estar coletivo depende de uma sociedade que valorize a escuta, o respeito e o suporte”, alerta
Em um país de dimensões continentais e desafios complexos, o Dia Mundial da Saúde Mental traz uma mensagem.
“Tratar o tema como prioridade social e política não é apenas uma questão de saúde pública, mas também um pilar fundamental para a construção de um trânsito e de uma sociedade mais seguros para todos.”
Fonte: Portal do Trânsito | Foto: Divulgação
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