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FALHAS NO SISTEMA DE SEGURANÇA DE CONTRA INCÊNDIO EM EDIFICAÇÃO ELEVADA

Publicado pela ABTLP

Uma questão inicial a ser respondida
Em uma edificação que está com sua documentação de Sistema de Combate à Incêndio em ordem pode ocorrer um incêndio? Veremos que sim, por alguns motivos.

A rotina da legalidade
Na investigação de um caso real de incêndio, fase normativa, verificou-se que o condomínio comercial B. possui Convenção do Condomínio expresso no Regimento Interno do ano de 2006. Os recursos humanos constituem- se de pessoal especializado nas atividades de vigilância e de segurança contra incêndio. Além dos vigilantes, o condomínio conta com bombeiro civil no serviço de 12×36 horas, diurno e noturno, nos sete dias da semana.

Os recursos materiais do condomínio B. é formado pelo conjungo de geradores, torres de resfriamento, cabine elétrica primária e subestações, sistema de detecção, alarmes de incêndio, hidrantes, extintores e chuveiros automáticos (spk). Os bombeiros civis devem conhecer as normas sobre equipamentos, sistemas, processos e métodos de segurança realizados por vistorias e testes de funcionabilidade na conformidade dos planos de trabalho. As empresas condôminas tomam conhecimento das regras de segurança pelas visitas de orientação dos bombeiros.

Em 2015, a administração do condomínio B. elaborou e publicou o cronograma de atividades técnicas, onde constava o calendário de treinamentos para a formação da brigada de incêndio e simulacros de abandono da edificação. As empresas do condomínio indicaram representantes para participação dos treinamentos da brigada de incêndio. Naquele ano foram realizados treinamentos de brigada de incêndio em fevereiro e agosto e para a execução do plano de abandono do edifício foram realizados em março e outubro.

Como resultado, o Corpo de Bombeiros do município expediu o Auto de Vistoria com validade até 2018, com base no projeto técnico de segurança contra incêndio conforme Decreto Estadual nº 56.819, de 10 de março de 2011, que institui o regulamento de segurança contra incêndio das edificações e áreas de risco e as Instruções Técnicas.

A quebra do rotina de segurança
A Empresa P., sediada no condomínio B., no período de agosto a novembro 2015, verificou que seu equipamento de no-break apresentava falhas de funcionamento. O equipamento estava instalado desde 2007. O setor de TI da Empresa P. solicitou a manutenção corretiva à Empresa D., por ser o melhor preço, para consertar o equipamento no-break. O sistema reinicializava, desligando os equipamentos elétricos da Empresa P. A empresa de manutenção D. não conseguiu sanar as falhas de funcionamento por desconhecimento técnico, motivando rompimento de contrato de manutenção entre as partes.

A TI da Empresa P. optou fazer a manutenção com a Empresa T. Por ser a empresa fabricante do equipamento, com profissionais especializados em no-break daquela marca, aliado ao fato de que a empresa T. é fornecedora exclusiva de peças por ela fabricadas. O serviço foi realizado por um engenheiro e um técnico, acompanhados por um técnico da D. e coordenador de TI da Empresa P. O condomínio B. autorizou o serviço de reparo. Após reparado, o no-break voltou a funcionar na sexta-feira.

No sábado, os funcionários da Empresa P. trabalharam, extraordinariamente, para repor as horas paradas devido as falhas no fornecimento de energia elétrica. Durante o serviço, os trabalhadores não perceberam nenhuma anormalidade (cheiro, odor, luzes piscantes, ruídos) ou que o equipamento no- break tenha reiniciado devido ao mal funcionamento. Para a surpresa, um severo incêndio ocorreu nas baterias do sistema no- break da empresa P. na manhã do domingo.

Fase de combate ao incêndio
O Posto de Bombeiros foi acionado para a ocorrência. Ele está cerca de três quilômetros do condomínio B. O tempo de resposta foi de 12 minutos. A situação inicial, quando da chegada dos bombeiros, foi avistar um edifício com fumaça nos andares 9º, 10º e 11º. A Central de Bombeiros despachou quatro viaturas, totalizando dez bombeiros. O tempo estava nublado. A temperatura era de cerca de 20ºC. As condições de acesso às viaturas e guarnições no domingo: trânsito livre. O abandono da edificação pelos ocupantes foi tranquilo após disparado alarme de incêndio. O principal risco para o trabalho dos bombeiros e socorristas era a intoxicação pela densa fumaça oriunda do conjunto de baterias. Verificou-se que a tática inicial empregada pelo funcionário do condomínio, o bombeiro civil C., cumprindo o protocolo, ao corretamente desligar a energia elétrica do prédio uma vez que o sistema spk entrou em funcionamento no andar sinistrado. O Bombeiro civil C. ainda utilizou dois aparelhos extintores de CO2 de 06 kg da Empresa P. Estas ações de combate ao fogo contribuíram para o desfecho da ocorrência: ventilação natural do local por meio de abertura de portas e janelas. Os bombeiros do município relataram falhas de equipamentos devido ao superaquecimento do sistema no-break do andar sinistrado. Por isso, houve consumo de água de cerca de 10 m³ do Condomínio para resfriamento do conjunto de baterias em chamas. Embora houvesse produção de fumaça tóxica, os bombeiros não registraram vítimas. O condomínio registrou a ocorrência no Distrito Policial da região.

Fases - ativa x passiva + investigativa x preventiva

Sequência de falhas da segurança
Verificou-se que o foco de incêndio se deu numa das baterias com danos às baterias adjacentes e das prateleiras de sustentação com derretimento da isolação dos cabos de conexão, resultando em estabelecimento de curto-circuito e fusão dos cabos envolvidos, gerando fumaça tóxica. Na fase estrutural, quanto ao comportamento da estrutura sob o fogo resultou em chamuscamento de piso, paredes e teto do abrigo de bateiras. Não houve colapso estrutural, porque o shaft é compartimentado por paredes de concreto, por isso o incêndio não se propagou para outras áreas. Devido ausência de bacia de contenção, a água do spk escoou para outros andares.

Sabe-se que a água pode provocar risco de pessoas serem eletrocutadas na presença de energia elétrica. A água de combate ao incêndio prejudicou o funcionamento do elevador de serviço. O condomínio resolveu deixar o edifício sem energia elétrica mesmo depois do conserto do elevador para vistoriar se não havia água em contato com energia elétrica, prevenindo outros acidentes. Isto motivou as empresas a paralisar suas atividades naquela semana. A energia foi sendo estabelecida por conta de cada empresa nos dias seguintes.

Investigação das Causas do Incêndio
Houve uma estimativa de danos materiais em cerca de R$ 500 mil. Diante da questão de quem pagaria os prejuízos pelas horas paradas de trabalho das empresas sediadas no condomínio e os danos materiais arrolados, a administração do condomínio B. enviou uma carta para a Empresa P. para negociar o pagamento dos prejuízos causados pelo incêndio no condomínio.

Isto gerou litígio entre as partes. Por isso, um pesquisador em incêndio foi contratado para arbitrar entre as acusações do condomínio e a obrigação de pagar os danos do incêndio pela empresa P. Após ouvir testemunhas e colher provas, foi identificado as seguintes
responsabilidades:

> Pelo Condominio: quando do treinamentos da brigada de incêndio, do plano de abandono da edificação, garantir que os funcionários treinados representem todas as empresas, a fim de que possam ser empenhados por meio de plano de chamada, quando da ocorrência de sinistro, fora do horário de expediente, para auxiliar os socorristas. Apresentar à Divisão de Atividades Técnicas do Corpo de Bombeiros
projeto técnico de segurança contra incêndio, quanto ao reposicionamento dos bicos do spk da sala shaft da Empresa P, evitando gerar o risco de eletrocutar pessoas, quando do contato da água com a energia elétrica do no-break.

> Pela Empresa P.: solicitar testes laboratoriais com análises periciais em organismos certificadores como laboratório de fogo no sistema no-break para verificar e analisar com os laudos técnicos elaborados pelas Empresas de manutenção das baterias sinistradas quanto ao dimensionamento, desempenho, regulagem, níveis de ajustes para recarga e outros fatores potenciais que geraram o superaquecimento durante o ciclo de funcionamento no período de agosto a novembro de 2015. A empresas de no-break D e a T poderiam apresentar o registro de datas e plano de ações adotadas durante suas manutenções, bem como as formas de descarte para as baterias sinistradas para garantia da saúde do meio ambiente.

O desafio de responder a questão inicial
Embora o condomínio B. tenha laudos, atestados, vistorias e alvarás validados pelo poder público e plano de trabalho e cronograma de atividades internas, verificou-se que as manutenções preventivas e corretivas nos equipamentos realizados pelas empresas condôminas precisam ser debatidas em reunião do condomínio mediante a apresentação de relatórios, fotos e laudos periciais e anotação de responsabilidade técnica da funcionabilidade de equipamentos, máquinas e sistemas com vigilância permanente.

Do resultado destas discussões, uma ação judicial de ressarcimento de danos poderia ser endereçada ao Poder Judiciário, ilustradas por
provas produzidas por profissionais e atas de reunião do condomínio dentre outros. Assim, o juiz de direito poderá decidir quem pagará os
danos causados pelo incêndio.

Omar Lima Leal, Coronel PM, perito de incêndio e auditor do meio ambiente, em São Paulo-SP, Brasil. Dados originais foram preservados. Contato: omarlimaleal@gmail.com

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