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AINDA AS CONCESSÕES RODOVIÁRIAS

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Em agosto do ano passado, escrevi um longo artigo, dividido em quatro capítulos, sob o título “PPPs, concessões e futuro”, que continuam disponíveis no blog. A sua motivação foi o excelente “Plano CNT de Transporte e Logística – 2014 (5ª Edição)”, que fez um inventário rigoroso das nossas carências nesta área, para concluir, de forma objetiva e certeira, que: “uma significativa parcela da infraestrutura de transporte, em todas as modalidades, encontra-se obsoleta, inadequada ou ainda por construir. Algumas delas operam no limite ou mesmo acima da sua capacidade, enquanto outras carecem de manutenção” (…) “essa situação representa um entrave ao crescimento do país e gera reflexos negativos, como aumento do tempo de viagens, maior custo operacional, aumento do número de acidentes e dos níveis de emissão de poluentes”.

Mas o estudo da CNT não se limitou ao diagnóstico. Num esforço técnico extraordinário, identificou, detalhou e quantificou 2.045 projetos prioritários de infraestrutura de transporte, de todos os modais, nas áreas de cargas e de passageiros.

Quanto custaria eliminar o nosso atraso logístico? O “Plano CNT de Transportes e Logística” responde, numa estimativa conservadora: R$ 987 bilhões, quase 20% do PIB!

Não dá para ter ilusões: com as atuais restrições orçamentárias, contando apenas com recursos públicos, não teremos condições de enfrentar este desafio nem nos próximos 30 ou 40 anos. Acontece que as obras listadas como prioritárias são “para ontem”; já deveriam estar concluídas e servindo à população. Como não estão, o mínimo que se espera é que elas sejam iniciadas e fiquem prontas no menor prazo possível. Para isso, não adianta ficar bradando impropérios ou exercitando preconceitos ideológicos: aquele investimento gigantesco terá de ser feito pela iniciativa privada mesmo, sob a forma de concessões ou PPPs. Ou não será feito.

Isso vale para o governo federal, tanto quanto para os Estados e municípios.

Como se sabe, o atual momento de crise econômica e política não é o ideal para atrair investimentos de grande porte para contratos de longo prazo de duração. Além disso, as grandes empresas brasileiras, investidoras tradicionais nesta área, estão muito ocupadas com os desdobramentos, que parecem não ter fim, da operação Lava Jato. Mas é este o desafio a superar. Ou fazemos isso logo, ou prolongaremos indefinidamente esse momento triste, de governança medíocre, onde tudo se torna negativo, até o crescimento.

Além de vencer os preconceitos já mencionados, é preciso superar também a reação emocional de parcelas da sociedade, inclusive no setor de transportes, que tendem a ver a cobrança de pedágio, não como contraprestação de investimentos e prestação de serviços relevantes, mas como uma espécie de sinecura [que pode até estar presente em algumas situações, mas não invalida, nem deve interditar, a celebração desses contratos públicos, na forma da lei].

Este sentimento difuso e equivocado, por óbvio, não contribui para a criação de um ambiente propício às concessões e PPPs. E colabora para aumentar a sensação de risco do negócio, o que conspira contra a desejada modicidade das tarifas.

Volto a este tema por conta do primarismo com que ele foi veiculado pelo jornal FOLHA DE S.PAULO, na sua edição de domingo (“Cotidiano”, 21/2), com direito a chamada de primeira página: “Alckmin planeja 25 novos pedágios em estradas paulistas”.

É incrível que, depois de mais de 20 anos de convívio com as concessões rodoviárias, prevaleça nas redações esta visão reducionista. Só faltou pedir a um dos competentes cartunistas do jornal, uma ilustração mostrando o governador trancado do palácio, com seus assessores, numa sala sombria, pregando alfinetes no mapa de São Paulo, a significar as tais 25 novas praças de pedágio, numa trama sinistra para prejudicar a população, quando, na verdade, o de que se trata ali é de algo muito mais complexo, estratégico e essencialmente positivo.

Ninguém planeja implantar praças de pedágios, nem a quantidade delas tem qualquer significado importante, sem que se saiba, ao menos, onde serão instaladas, qual o valor da tarifa e qual a quantidade de quilômetros esta tarifa vai franquear ao usuário. Aliás, está na hora de os nobres jornalistas aprenderem que o jeito certo de avaliar e comparar tarifas de pedágio é por quilômetro e não por praça.

Por outro lado, muitas vezes é melhor ter mais praças de pedágios porque, se bem localizadas, elas evitam evasão e garantem uma quantidade maior de usuários pagantes e, assim, uma redução da tarifa resultante. “Onde todos pagam, todos pagam menos”. Ao contrário, quando muitos deixam de pagar o pedágio, porque a posição das praças permite um tráfego significativo sem pagamento, os que pagam, certamente arcarão com um ônus muito maior. “Não existe almoço grátis”. Alguém sempre pagará pelos que andam de graça.

A notícia que não foi dada; ou que foi dada da pior forma possível – porque errada e porque aparentemente calculada para causar mal-estar na população – é a de que o governo do Estado planeja realizar novas concessões, isto é, que tais e quais novos trechos rodoviários terão a sua gestão delegada à iniciativa privada, o que, insisto, é essencialmente positivo, porque sinaliza que em breve novas rodovias concedidas apresentarão melhora substancial, com mais conforto, segurança e redução de custos para os usuários.

Redução de custos, sim, por mais que isso possa chocar muita gente.

Depois de ter vivido a primeira fase das concessões dentro de empresa de transporte, gerindo frotas e acompanhando custos operacionais, não tenho a menor dúvida em afirmar que, até no Estado de São Paulo, em que as tarifas são reconhecidamente mais elevadas em razão do modelo adotado, a relação custo/benefício da concessão é, no final, muito favorável ao usuário (sem prejuízo de poder ser, também, um bom negócio para o concessionário – em algumas concessões mais do que em outras).

Participei também, durante as últimas duas décadas, de dezenas de reuniões de grupos paritários (comissões tripartites) de concessões, entendendo a lógica do sistema e aprendendo os “pulos do gato”. E, por fim, fui conselheiro da ARTESP, agência reguladora estadual, e tive muitas discussões no âmbito da ANTT, já como presidente da NTC&Logística.

É com essa visão ampla, tendo tido a oportunidade de conhecer a realidade a partir do ponto de vista de cada um dos envolvidos: do usuário particular, do transportador, do concessionário e do poder público, é que não pratico “achismo” nesta matéria. Tenho, isso sim, convicções muito firmes e fundamentadas, no sentido de que, a depender de alguns ajustes que o modelo ainda comporta, a delegação da gestão da infraestrutura de transporte para a iniciativa privada é a solução mais indicada em praticamente todas as situações.

E é por ter certeza disso, que fico realmente muito irritado quando vejo tanta desinformação. É um absurdo que se continue tentando vender como má notícia o que, na verdade, é a única solução que nos resta para ainda poder sonhar com uma retomada de crescimento, sem que ela se converta, mais uma vez, em “voo de galinha”. Porque quase 1 trilhão de reais (ou um quarto de trilhão de dólares) de investimento privado, nacional e estrangeiro, levanta e anima qualquer economia.

É, além de tudo, o mais formidável programa anticíclico que se poderia imaginar, sem que o governo precise gastar nada – ao contrário, reduzindo os seus gastos e aumentando as suas receitas, por conta da reativação da atividade econômica.

É o antídoto perfeito para a nossa “tempestade perfeita”…

* * * * *

Ainda sobre a “CPMF compensável”.

Estou devendo ao amigo Paulo Roberto Guedes uma resposta ao longo e-mail que me remeteu contestando a sugestão suscitada no meu artigo de duas semanas atrás (A CPMFfora da caixa”).

Ele achou a ideia interessante, mas considera a tentativa de recriação deste tributo “um erro e não será solução para quaisquer dos problemas brasileiros atuais (…) pois além de gerar um desgaste extraordinário junto à sociedade e um problema ainda maior no Congresso Nacional (…) irá aumentar os custos de produção e tirar dinheiro de um mercado já enxuto e sem recursos para o consumo e o investimento”.

E prossegue, lembrando que a nossa economia está em recessão há pelo menos dois anos e que caminha para mais uma queda do PIB em 2016, o que provocou a erosão da receita tributária. ”Portanto, agora, espera-se que o aumento da receita se dê através do crescimento da economia e não através do aumento das alíquotas ou de novos impostos”, mesmo porque a carga tributária já está muito elevada, devendo chegar a 36% do PIB neste ano.

Além disso, lembra que, segundo cálculos do próprio governo, o potencial arrecadatório da CPMF seria de R$ 35 a R$ 40 bilhões, o que representa muito pouco frente ao déficit primário de 2015 e o que se espera para 2016.

Em seguida, toca no ponto em que, aliás, não há qualquer divergência entre nós, qual seja o do crescimento descontrolado da relação dívida/PIB, que foi objeto do meu antepenúltimo artigo (“Como previsto, os juros arruinaram a relação dívida/PIB”), para concluir que a única solução para a gravíssima crise em que nos encontramos passa pela redução fortíssima dos gastos públicos (inclusive com eliminação das vinculações constitucionais e a redefinição do tamanho do Estado brasileiro) e pela retomada do crescimento econômico. Estamos absolutamente alinhados em tudo isso.

Vou pular a parte política da mensagem do Paulo, porque ele não me autorizou a divulgá-la. Quero insistir apenas, por oportuno, que as “pedaladas fiscais” não me convencem como justificativa do impeachment, pelo simples fato de que me soam mais como pretexto, do que propriamente como fundamento jurídico. Note-se que a argumentação neste sentido vem sempre acompanhada da questão da perda da credibilidade e das condições para governar, muito na linha da posição defendida recentemente pela FIESP, que já critiquei aqui; fala-se em impeachment, mas o que se busca, de fato, é um “voto de desconfiança”, solução típica do sistema parlamentarista. No nosso presidencialismo, consagrado pela Constituição e por dois plebiscitos, isso não é possível, senão praticando gravíssima ofensa ao estado de Direito. Ora, se o que se quer, entre outras coisas, é recuperar a credibilidade perante o mundo, não é bom ir por este caminho.

Mas, voltando à ideia da “CPMF compensável”, o que sustentei é que, com este ou com qualquer outro governo, vamos precisar fechar as contas, com redução de despesas e, inevitavelmente, com alguma forma de aumento de arrecadação, para compensar a grande queda da receita tributária, pelos motivos já comentados. Porque, se isso não for feito, ninguém tenha dúvida, as contas vão acabar fechando do mesmo jeito, só que pela via da inflação, que é, de todas, a pior solução.

O que talvez tenha faltado ao Paulo perceber e valorizar é que, na proposta de “CPMF compensável”, não haverá aumento de carga tributária para quem já paga seus impostos (por força da compensação), mas um aumento de arrecadação proveniente de um tributo praticamente insonegável, que alcança todas as atividades informais, inclusive criminosas, que, segundo sempre se sustenta, corresponde quase a um outro Brasil, oculto, que, não obstante, passaria a pagar imposto.

Feito assim o registro da opinião divergente, e mesmo compreendendo, respeitando e agradecendo os argumentos do amigo e leitor assíduo deste blog, não encontro razões para modificar a posição que defendi anteriormente, sempre lembrando que, talvez, não valha a pena levar tão a sério sugestão nascida numa reunião de entidade de classe, que não está posta, por ora, na agenda do governo, nem na do Congresso Nacional. Eu a registrei naquele artigo porque a considerei realmente muito interessante e numa homenagem ao amigo e ex-presidente da NTC, Oswaldo Dias de Castro.

Não se perca de vista, entretanto, que daqui a pouco tempo, a proposta do Governo de recriação da CPMF entrará em discussão no Congresso. Do jeito que foi apresentada dificilmente passará, mas a gente sabe como essas coisas acontecem por lá, na hora de votações importantes. De repente, algo na linha sugerida pelo Oswaldo pode vir a se constituir, quem sabe, em saída honrosa para todos.

Geraldo Vianna é advogado, consultor em Transportes, ex-presidente da NTC&Logística e Diretor da CNT.

Fonte: NTC&Logística

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